domingo, 4 de janeiro de 2009

os iluminados


Enferrujado e desacostumado a ficar em silêncio ou sem internet, aproveitei o final da manhã de hoje pra ler, de uma patada, a segunda metade de “O Exército Iluminado”, de David Toscana, escritor mexicano que até há pouco só sabia por ouvir dizer. A primeira metade me levara duas semanas para ser lida, sem que houvesse motivo especial (ou falta dele) para minha apatia. Mas o tempo fechado, e a manhã que parecia de outono hoje em São Paulo, com um vento que logo me lançou de volta ao cobertor, me levaram por impulso a voltar à missão, com uma concentração que não havia encontrado nos últimos dias. Resultado: em pouco menos de 200 páginas, consegui perder a conta de quantas vezes tive de fechar o livro para rir. Rir rir mesmo, como se estivesse assistindo a algum episódio de Monty Phyton, uma das poucas coisas que me fazem ter dor de barriga quando vejo. A história, em si, já vale a entrada. O livro conta a história dos surtos protagonizados por Ignacio Matus, um professor nacionalista frustrado e amargurado por colecionar desaforos e desautorização de alunos décadas mais jovens que ele. Desafortunado também por jamais ter sido mandado para uma Olimpíada para testar seu talento como maratonista. O jeito é simular trajeto similar, em sua Monterrey, para competir, a milhares de quilômetros, com os maratonistas que disputavam a prova oficial em Paris, em 1924 – por ter finalizado a sua prova particular com tempo pior apenas aos do primeiro e segundo colocados, passa parte da vida cobrando, por direito, a medalha de bronze e a condecoração que o anonimato lhe negara – e fora brotar no peito de um competidor americano. Cansado de desaforos, resolve, um dia, reunir uma turma de jovens com problemas mentais, coloca todos numa carroça, e parte em direção ao Norte para empreender uma inglória missão: tomar o Texas dos Estados Unidos e anexá-lo ao território mexicano. O moinho da vez é o Exército americano, além do desafio de motivar uma tropa que baba, dorme, surta, ouve vozes, confunde qualquer córrego com o rio Bravo e, já a caminho da empreitada, ainda precisa descobrir se é preciso matar uma legião inteira para se vencer uma guerra. O esforço para se entender as alegorias (o sectarismo do espírito antiamericano? a bravura de quem se sujeita a contestar a ordem dominadora? a morte do bom senso em meio às omissões? a releitura, pós 11 de setembro, de ataques terroristas armados contra alvos nem sempre bem escolhidos? o uso de inocentes para missões tampouco insanas?) vale menos do que a experiência de se ter à frente uma bela história, e muito bem escrita. É uma espécie de “Incrível Exército de Brancaleone” em letras, que lembra as tiradas de um Luis Fernando Veríssimo, mas com a imaginação fantasiosa de um Juan Rulfo em dias atuais – aliás, é incrível como tudo no México parece ter uma herança dele em algum canto, talvez até mais do que as pegadas machadianas no Brasil. Pena que minha primeira grata descoberta do ano me foi apresentada com atraso, e ainda assim graças a uma inesperada inversão térmica que me manteve na cama neste primeiro domingo de 2009.

Um comentário:

M.S. disse...

O Evair é uma bichona.