terça-feira, 2 de dezembro de 2008

ainda Anne Bancroft


Durante algum tempo sofri por Ms. Robinson. Senti que lhe faltou uma palavra amiga quando mais precisou de mim. Pagara um preço alto demais por ter desdenhado algumas normas básicas sobre amores impunes. Ms. Robinson não era pessoa má. Mesmo assim, sofreu o destino das grandes vilãs. Custou a acreditar que havia perdido grande tesouro ao ver Dustin Hoffman se mandar com a filha debaixo dos braços. Foi-se embora: paciência. Não foi o primeiro nem seria o último amor mal-resolvido. Benjamin foi só brincadeira que ela havia inventado para se distrair entre um trago e outro. No fim das contas, contou-me ter se divertido com a tremedeira que o rapaz apresentava todas as vezes que sentia o cheiro da água de colônia em que ela se banhava. O prazer que o rapaz era capaz de oferecer não era metade daquele sentido por Ms. Robinson quando via os engasgos do genro ao sentir o mesmo cheiro das noites pecaminosas – antes de escutar seus passos na escada, ela corria ao armário, a se banhar. Voltava, naquele cheiro que penetrava a memória afetiva do mesmo menino assustado de tantos anos atrás. A tristeza dela os homens jamais vão entender. É que até mesmo as pedras decorativas do imenso saguão de sua sala de estar sabia que o amor pela filha não seria superado por qualquer indisposição. Mas existem coisas que só as mulheres, no sentido mais restrito da palavra, conseguem entender. Benjamin colocou em duelo duas gerações. O prêmio era menos importante que a vitória. A vaidade de Elaine em superar a mãe seria menor somente que o de sua mãe, caso esta tivesse levado os louros da idade. Inconscientemente, Elaine vingou-se das tardes chorosas quando se enciumava ao ver os amigos da escola falando da mãe. Era preciso uma pincelada a mais de graça para que Elaine vencesse a mãe em charme e comedimento. Ms. Robinson tinha no olhar o fogo de uma paixão a ser cuspida. A forma com que cruzava as pernas durante eventos familiares, a maneira pretensiosa com que amarrava os cabelos, o estilo impresso nos dedos ao segurar a ponta do cigarro; tudo nela era inspirador e livre. Ms. Robinson sabia disso e não poupava esforços para ter algo mais com que se preocupar durante as tardes – e noites – insones e vagas, a esperar voltar à casa o marido. Pagava para ver o que ou quem mais valia. Por isso, por algum tempo murchou –vendo a filha ganhar a disputa. Tempos depois, havia esquecido a querela. Distraia-se facilmente ao ver os rapazinhos, filhos dos amigos do marido, deixarem a escola, a mochila ainda nas costas, a calça de moletom se arrastando pelo chão. A tática era ainda a mesma. Primeiro, pedia para que lhe acendessem o cigarro; antes de soltar o primeiro trago, deixava a piscadela; na brecha, o rapaz, hora dessas, já se perguntava se aquilo era proposital. Depois, fazia questão de sentar-se ao lado, colando pernas. Num abraço, seja oi ou tchau, afagava com destreza a nuca do menino. No beijo de chegada, sempre um escape na ponta da boca que se tocava num lábio já tremente. Quando deixavam de fitá-la nos olhos, era hora de se jogar. A jogada da carona era conhecida e infalível – gostava, todo jeito, dos moralistas. “Não posso, isso não é direito”. Era o que mais escutava. Vibrava, então, e vivia o ponto-auge da batalha, logo que podia questionar ao sujeito, com ares de inquisição: “Por acaso você não está pensando que estou me insinuando a você, está?”. “Não senhora Robinson. Jamais ousaria supor uma coisa dessas”. Dali em diante, a história era a mesma: ao ver o rapaz subir sozinho ao quarto, não demorava a se apresentar. Ficavam, assim, a sós. O marido estava por chegar, o que geralmente era verdade. Dia seguinte, recebia um telefonema: “Se a proposta ainda estiver em pé...Sabe...Estou aqui. Estou pra você”. Ms. Robinson era mulher de muitos amores para uma vida só.

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